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quarta-feira, fevereiro 13, 2013

Lições para 'o caminho' [Km 258]

A humildade corresponde a um estado de alma no qual uma pessoa encontra alguma serenidade que deriva dela saber o tamanho de sua ignorância.

Os que toleram bem as dúvidas tendem a ser mais humildes; os que não as aceitam se apegam a convicções e as defendem com certa arrogância.

A humildade não tem a ver com submissão e obediência a outras pessoas: o importante é conseguir controlar a lamentável vaidade intelectual.

Aqueles que cultivam a humildade são eternos aprendizes, sempre dispostos a trocar suas ideias por outras que lhes pareçam mais adequadas.

A sabedoria corresponde a um estado de serenidade e grande prazer que deriva do entendimento satisfatório de si mesmo e da condição humana.

Encontrar-se com a sabedoria é difícil e trabalhoso; porém, muita gente poderá chegar lá. Fama e fortuna sempre contemplarão a uns poucos.

São poucas as pessoas que, hoje em dia, buscam a sabedoria. A maioria está voltada para atividades competitivas, essas sim muito valorizadas.
(Flávio Gikovate, médico-psiquiatra, psicoterapeuta, conferencista e escritor)

sábado, outubro 13, 2012

Lições para 'o caminho' [Km 254]

Abaixo, trecho da entrevista que o psicanalista inglês, Adam Phillips, concedeu à revista Veja, na edição 1793, de março de 2003:

Por que o número de cirurgias plásticas e implantes de silicone não pára de aumentar?
Phillips – Hoje as pessoas têm mais medo de morrer do que no passado. Há uma preocupação desmedida com o envelhecimento, com acidentes e doenças. É como se o mundo pudesse existir sem essas coisas. Há uma enorme sensação de invisibilidade. Todo mundo acha que ficou de fora de algo, mas não sabe do que exatamente. É como se sempre houvesse uma festa imperdível em algum lugar e ninguém conseguisse encontrar o local. A obsessão por beleza reflete a necessidade de ser amado e aceito.

Essa necessidade é maior hoje do que era no passado?
Phillips – Na cultura atual, parece que há apenas dez pessoas que realmente estão vivendo. São as celebridades. O resto encontra-se num nível bem mais baixo. Isso tudo é um absurdo sem tamanho. A idéia de uma vida boa foi substituída pela de uma vida a ser invejada. Esse estado de coisas deixa muita gente enfurecida e infeliz.

Por que mulheres e homens parecem totalmente obcecados por dietas de emagrecimento e exercícios?
Phillips – É uma nova versão do que Freud chamou de histeria. Mas, desde que ele escreveu sobre o assunto, as coisas pioraram. Todos devem estar se sentindo muito enfermos e vulneráveis para se preocupar de forma tão doentia com a saúde. O sexo é outro assunto preocupante. Hoje todo mundo fala de sexo, mas ninguém diz nada interessante. É uma conversa estereotipada atrás da outra. Vemos exageros até com crianças, que aprendem danças sensuais e são expostas ao assunto muito cedo. Estamos cada vez mais infelizes e desesperados com o estilo de vida que levamos.

Isso tem relação com o número de casos de depressão?
Phillips – Muitas pessoas conseguem suportar o mundo contemporâneo apenas num estado de depressão. Se não estivessem assim, ficariam enfurecidas e tentariam mudar o mundo. Hoje trabalhamos e produzimos numa velocidade que impede a reflexão sobre o significado de nossa vida. Estamos hipnotizados. Vivemos em sociedades em que é mais importante ser rico do que ter amigos íntimos, mais importante ser famoso do que amar. Isso é enlouquecedor. Estamos todos muito sós e famintos de contatos eróticos que sejam genuinamente criativos.

O que é depressão?
Phillips – Para muita gente, é melhor estar quase morto que totalmente vibrante diante de uma situação difícil. A depressão funciona como um escudo para evitar situações conflituosas. Esse tipo de comportamento certamente aumentou. Dito isso, sofremos de outro tipo de problema. É a indústria do diagnóstico. Nos consultórios, qualquer tristeza é chamada de depressão.

Muitas crianças têm agenda lotada de compromissos. Há tempo para ser criança no mundo atual?
Phillips – Com certeza, não. As crianças entram na corrida pelo sucesso muito cedo e ficam sem tempo para sonhar. Há grande ansiedade da parte dos pais em relação ao futuro. Essa pressão está literalmente enlouquecendo muitas crianças. A decisão sobre a profissão está acontecendo cada vez mais cedo. No século XIV, se as pessoas fossem perguntadas sobre o que queriam da vida, diriam que buscavam a salvação divina. Hoje a resposta é: "ser rico e famoso". Existe uma espécie de culto que faz com que as pessoas não consigam enxergar o que realmente querem da vida.

Do ponto de vista dos pais, não é legítimo o desejo de sucesso e riqueza para os filhos?
Phillips – Claro. Não acho que as crianças deveriam ser educadas para se tornar revolucionárias. Mas é possível melhorar o que temos. Os pais devem ter como objetivo garantir o futuro de seus filhos e, ao mesmo tempo, deixá-los mais à vontade, com mais tempo e espaço para ser menos focados, menos objetivos. Adiar as decisões sobre o futuro, dar tempo ao tempo.

O senhor consegue atingir esse equilíbrio com sua filha de 8 anos?
Phillips – Acho que sim. Não fico tentando entender tudo que minha filha faz e diz. Estou mais preocupado em que se divirta. Não acredito num planejamento milimétrico para o futuro de uma criança, como se tudo pudesse ser programado.

Há alguns anos se fala da necessidade de dar limites aos filhos. Por que os pais acham essa tarefa tão difícil?
Phillips – É assim porque os pais não acreditam nos limites. É preciso acreditar neles para que funcionem. A cultura em que vivemos não facilita esse trabalho. Os pais criam limites que a cultura não sanciona. Por exemplo: alguns pais tentam controlar a dieta dos filhos dizendo que é mais saudável comer verduras do que salgadinhos enquanto as propagandas dão a mensagem diametralmente oposta. O mesmo pode ser dito em relação ao comportamento sexual dos adolescentes. Muitos pais procuram argumentar que é necessário ter um comportamento responsável enquanto a mídia diz que não há limites.

Como os pais podem resolver esse problema?
Phillips – Resolver o problema é algo muito ambicioso. O que podemos fazer é instruir as crianças a interpretar a cultura em que vivemos. O que está a nosso alcance é ensiná-los a ser críticos. Mostrar que as propagandas não são ordens e devem ser analisadas. Será que realmente precisamos de tal coisa? Será que é a melhor opção? Será que tal comportamento é o melhor? Outro problema é a incapacidade dos adultos de ser adultos. Os pais também devem aprender a ser odiados pelos filhos em algumas ocasiões. Muitas pessoas têm filhos porque acham que o nascimento deles é uma garantia de que serão amados de forma incondicional e eterna. Por isso, têm receio do ódio e da desaprovação deles. Tratam crianças como se fossem adultos. Uma coisa precisa ficar clara de uma vez por todas: embora reclamem, as crianças dependem do controle dos adultos. Quando não têm esse controle, sentem-se completamente poderosas, mas ao mesmo tempo perdidas. Hoje há muitos pais com medo dos próprios filhos.

Os remédios e as terapias alternativas estão acabando com a psicanálise?
Phillips – A psicanálise está apenas começando. A experiência de ser ouvido é muito poderosa. Definitivamente, tem efeito benéfico. É verdade que num mundo ideal ninguém precisaria de analista. O diálogo com os amigos daria conta do recado. O problema é que não temos a coragem de contar certas coisas aos amigos. Outras podemos até contar, mas os amigos não sabem como ajudar.

Os amigos, pelo menos, não cobram uma exorbitância para ouvir, não é verdade?
Phillips – Essa crítica é totalmente válida. Ninguém deveria escolher a profissão de psicanalista para enriquecer. Os preços das sessões deveriam ser baixos e o serviço, acessível. Deve-se desconfiar de analistas caros. A psicanálise não pode ser medida pelo padrão consumista, do tipo "se um produto é caro, então é bom". Todos precisam de um espaço para falar e refletir sobre sua vida.

sexta-feira, novembro 13, 2009

Lições para 'o caminho' [Km 229]

Primeiras reflexões sobre a vaidade humana (*)
(Flávio Gikovate)

...Exercemos o exibicionismo por todas as formas, desde a mais inofensiva, que é o de caráter físico até a mais perigosa, que corresponde ao exibicionismo intelectual. O exibicionismo intelectual é o mais grave, porque nossa razão deveria estar a serviço de nos ajudar a ver a realidade como ela é e também a nos posicionar de forma adequada diante dos fatos.
Nossa vaidade nos leva a desenvolver uma certa aversão aos fatos, especialmente aqueles que não combinam com o que gostaríamos que fossem os que efetivamente existem. Passamos a brigar contra a realidade e a substituí-la por nossas ideias. Num determinado momento, passamos a acreditar que nossas ideias correspondem aos fatos.
Não importa muito como achamos que o mundo e as pessoas deveriam ser. Temos que nos ater ao que é. Não importa acharmos que o amor é que deve nortear as relações entre as pessoas e que a sexualidade deveria estar acoplada ao encontro de parceiros compatíveis e legais. Isso é o que alguns pretendem, mas não é o que todos querem e nem mesmo o que se observa na prática da vida.
...A vaidade cega, subtrai o bom senso, nos afasta da realidade e do que é possível para nós. A vaidade nos afasta da reflexão útil e nos leva a querer ganhar discussões. Não é este o meu objetivo, como de resto nunca foi este o meu modo de me posicionar perante os problemas da psicologia. Acho que nós deveríamos nos voltar para os fatos e tentar interpretá-los de todas as formas possíveis. Mas os fatos e não aquilo que gostaríamos que eles fossem.

* Extraído e editado à partir do artigo original publicado pelo autor, em seu site.
** Flávio Gikovate é médico psiquiatra, psicoterapeuta e escritor.

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