quarta-feira, fevereiro 24, 2010

Lições para 'o caminho' [Km 240]

Seu verdadeiro trabalho pode estar lhe esperando.
(John Scott, 73 anos)

Quando eu tinha 20 anos, estive em um navio que foi afundado por um submarino alemão. Ficamos à deriva em um bote salva-vidas, no meio do Oceano Pacífico, por mais de dois meses. Nossas provisões se acabaram em três semanas. Pegávamos cada gota de água de chuva, pois a fome que sentíamos não era nada em comparação à sede.
Eu decidi aceitar o que cada dia trazia em vez de lutar contra. Concentrei-me no céu – as cores, as formas, os diferentes tipos de luz. Os outros rapazes riam de mim, mas eu os ignorava. Eles pensavam então que eu estava rezando. Um a um, os homens que não conseguiram desviar a mente de sua sede morreram.
Dali para a frente, por muito tempo depois da guerra, eu via cores, formas e luzes o tempo todo, pintadas na minha mente, mas não comecei a pintar de fato até os 60 anos. Quando finalmente peguei em um pincel e comecei a pintar, percebi que esse era o meu verdadeiro trabalho. Se ao menos eu tivesse ouvido a mim mesmo da forma como ouvi naquele bote salva-vidas! Agora, estou com pressa quando poderia ter passado uma vida inteira como artista.


John Scott começou a pintar por volta dos 60 anos e concluiu mais de 50 telas. Então, desafiou a si mesmo com a fotografia. Fotografou gotas de chuva em flores, nuvens surgindo e sumindo, distorções em edifícios refletidas em janelas vizinhas e flagrantes de pessoas fazendo pausas em atividades urbanas. Todos os meses, ele separava uma parcela do seu mirrado cheque da aposentadoria para revelar um número restrito de rolos de filmes. John era um budista que acreditava no empenho pessoal para atingir uma profunda receptividade na experimentação da vida, apesar de também acreditar na aceitação do transitório. Pouco antes de morrer, ele deu um pequeno número de pinturas a alguns amigos e pediu que o restante fosse doado a uma escola local de arte, para que os estudantes carentes pudessem reutilizar suas telas.

Copyright © 2002 by Wendy Lustbader ('O que vale a pena...' - 6.a Edição) Todos os direitos reservados. All rights reserved.

segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Lições para 'o caminho' [Km 239]

Toda noite, antes de dormir, faça a si próprio duas perguntas simples:
De algum modo, eu cresci hoje como ser humano?
Será que hoje, de algum modo, eu transformei o mundo num local melhor para se viver?
Quando puder responder sim a estas perguntas com mais freqüência do que não, você estará vencendo – estará obtendo sucesso.
Ter um propósito na vida não é uma panaceia para a felicidade ou para os bons sentimentos perpétuos. Mas é a resposta fundamental para o que torna a vida significativa, independente da gravidade dos desafios.

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terça-feira, fevereiro 09, 2010

Lições para 'o caminho' [Km 238]

O inimigo interno

Nasrudin viu um homem sentado na beira de uma estrada, com ar de completa desolação.
- O que o preocupa? – quis saber.
- Meu irmão, não existe nada interessante na minha vida. Eu tenho dinheiro suficiente para não precisar trabalhar, e estava viajando para ver se havia alguma coisa curiosa no mundo. Entretanto, todas as pessoas que encontrei nada tem de novo para me dizer, e só conseguem aumentar meu tédio.
Enfim: posso dizer sem qualquer medo que apesar de tudo que fiz, não consegui encontrar a paz que buscava. Transformei-me em meu pior inimigo.
Na mesma hora, Nasrudin agarrou a mala do homem, e saiu correndo pela estrada. Como conhecia a região, rapidamente conseguiu distanciar-se dele, pegando atalhos pelos campos e colinas.
Quando se distanciou bastante, colocou de novo a mala no meio da estrada por onde o viajante iria passar, e escondeu-se por detrás de uma rocha. Meia hora depois o homem apareceu, sentindo-se mais miserável que nunca, por causa do ladrão que encontrara.
Assim que viu a mala, correu até ela e abriu-a, ofegante. Ao ver que seu conteúdo estava intacto, olhou para o céu cheio de alegria, e agradeceu ao Senhor pela vida.
Certas pessoas só entendem o sabor da felicidade, quando conseguem perdê-la”, pensou Nasrudin, olhando a cena.

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quarta-feira, fevereiro 03, 2010

Lições para 'o caminho' [Km 237]

Tripalium versus poiesis

A ideia de trabalho como castigo precisa ser substituída pelo conceito de realizar uma obra.

Por que muitas vezes a ideia de trabalho é associada a castigo, fardo, provação? Do ponto de vista itimológico, a palavra "trabalho" (assim como em francês, espanhol e italiano) tem origem no vocábulo latino tripalium, que era um instrumento de tortura, ou seja, três paus entrecruzados para serem colocados no pescoço de alguém e nele produzir desconforto.
...O trabalho como castigo persiste. Tanto que a maior parte das pessoas diz: "Quando eu parar de trabalhar, eu vou fazer isso, isso e isso". Sendo que isso é uma ilusão, porque você pode dizer: "Quando eu não tiver dependência em relação ao trabalho, eu vou fazer isso". Mas parar de trabalhar, você não vai parar nunca. Nem pode. Porque você nunca deixará de fazer a sua obra. Seja a sua obra aquela que você faz para continuar existindo, seja para ter o seu reconhecimento. Eu me vejo naquilo que faço, não naquilo que penso. Eu me vejo aqui, no livro que escrevo, na comida que preparo, na roupa que eu teço.
Etimologicamente, a palavra "trabalho" em latim é labor. A ideia de tripalium aparecerá dentro do latim vulgar como sendo, de fato, forma de castigo. Mas a gente tem de substituir isso pela ideia de obra, que os gregos chamavam de poiesis, que significa minha obra, aquilo que faço, que construo, em que me vejo. A minha criação, na qual crio a mim mesmo na medida em que crio no mundo.
Vejo o meu filho como minha obra, vejo um jardim como minha obra. Tenho de ver o projeto que faço como minha obra. Do contrário, ocorre o que Marx chamou de alienação: todas as vezes que eu olho o que fiz como não sendo eu ou não me pertencendo, eu me alieno. Fico alheio. Portanto, eu não tenho reconhecimento. Esse é um dos traumas mais fortes que se tem atualmente.
Todas as vezes que aquilo que você faz não permite que você se reconheça, seu trabalho se torna estranho a você. As pessoas costumam dizer "não estou me encontrando naquilo que eu faço", porque o trabalho exige reconhecimento - conhecer de novo.
Hoje, quando penso em um trabalho de qualidade de vida numa empresa, estou pensando em um trabalho que não seja alienado. Trabalhar cansa, mas não necessariamente precisa gerar estresse. Isso tem a ver com resultado, trabalho tem sempre a ver com resultado.
Por que um bombeiro, que não ganha muito e trabalha de uma maneira contínua em algo que a maioria de nós não gostaria de fazer, volta para casa cansado, mas de cabeça erguida? Por causa do sentido que ele vê no que faz. Por causa da obra honesta, a serviço do outro, independentemente do status desse outro, da origem social, da etnia, da escolaridade, etc.
Aí, não é suplício.

Copyright © 2007 by Mario Sergio Cortella ('Qual é a tua obra?', Ed. Vozes, 2007) Todos os direitos reservados. All rights reserved.